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Vanira
Silva Benato, farmacêutica bioquímica e consultora,
com mestrado na área de Alimentos, do Centro de Informações
Toxicológicas do Hospital Universitário (CIT/HU),
professora substituta do Departamento de Patologia (UFSC).
Os
assuntos principais são agentes tóxicos, poluentes
e efeitos sobre a saúde humana
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Como
o CIT funciona?
O CIT funciona como um convênio entre a Secretaria de Saúde
do Estado e o Ministério da Saúde, através
da Universidade Federal. Ele presta informações, vinte
quatro horas por dia, nos casos de intoxicação ou
envenenamento para todo o Estado de Santa Catarina (telefones 0800
6435252 ou (48) 331-9173 e 331-9535).
Quais
são as áreas de atuação da Toxicologia?
Ela tem vários campos: analítica, experimental e clínica
e área de atuação: ambiental, ocupacional,
alimentos, medicamentos ou cosméticos, social e forense.
A nossa área é bem abrangente, atinge todos os campos.
A
Sra. comentou que as pessoas ainda procuram pouco o CIT…
Quem mais nos procura é o profissional médico, direto
das emergências dos hospitais, que quer mais informação
quando acontece uma intoxicação aguda. Depois, temos
outras instituições de saúde, escolas, estudantes,
comunidade em geral. Por exemplo, hoje, no campo ocupacional, a
gente sabe que quem mais sofre é o nosso agricultor, mas
ele só procura o serviço médico quando já
está apresentando algum sintoma, agudo ou crônico.
Nos outros serviços ocupacionais, talvez por falta de informação,
eles não nos procuram prá saber o que o produto com
que trabalha pode causar à saúde. Alguns, talvez,
por medo, por achar que a gente vai fazer alguma coisa e ele vai
perder o emprego, que é uma coisa tão difícil
hoje.
Nessa
área ocupacional, tem pessoas que ligam e não querem
se identificar?
Ah, sim. Tem pessoas que ligam e dizem: "eu trabalho com tal
e tal produto", mas não querem se identificar. A gente
pergunta se ele tem equipamento individual de segurança…
porque o certo é a pessoa trabalhar com segurança.
A gente pergunta: a sua sala é bem arejada? "Não,
não, por favor… eu só quero saber porque é
o meu emprego que tá em jogo, eu tenho uma família
e tal…". Então, a gente nota que as pessoas tem
medo de alguma represália. Na verdade, não é
isso. Nossa intenção não é essa, é
simplesmente passar informação para ele possa trabalhar
com condições seguras, sem prejudicar a saúde.
Qual
é a média de atendimento?
No verão, a gente tem mais atendimento porque nós
temos os animais peçonhentos e as pessoas se expõem
mais… Como nós somos um centro de referência,
então o atendimento fica em torno de 15 casos por dia. No
inverno, em torno de 8 casos. No verão são casos de
mordidas de animais peçonhentos: aranhas, serpentes, jararaca…
Na ilha, nós temos casos de mordidas de jararaca e coral.
Além
desses, que outros casos mais aparecem?
O que mais tem é intoxicação por medicamento
em crianças com menos de cinco anos de idade. Sem ser os
animais peçonhentos, os medicamentos são o que mais
as pessoas procuram por informações. Veja, o medicamento
é para diagnóstico, prevenção e tratamento,
não é prá ser colocado em qualquer lugar e
criança ter acesso. Tanto que vem na caixa: mantenha fora
do alcance de crianças, mas isso não acontece. As
crianças tem acesso fácil a esse tipo de produto como
têm acesso fácil aos domi-sanitários, produtos
para limpeza em geral: água sanitária, sabão
em pó… No meio disso, às vezes, tem raticidas,
tem algum piretróide, aquelas pastilhas prá mosquito…
E
os agrotóxicos? Dá prá quantificar as intoxicações?
A notificação que é feita é muito pouca.
Perto do que a gente imagina de casos de intoxicação
que acontecem… é muito pouca. Por uma questão
de cultura, não disseram prá ele, o agricultor, que
aquele produto pode prejudicar a sua saúde, então
ele se expõe, ele acha que o pai, o avô usaram o produto
e nada aconteceu, então nada vai acontecer com ele. Não
é assim, os produtos e as formulações vão
se modificando e isso vai causando um dano à saúde.
Geralmente,
eles chegam com que tipo de sintomas?
Vamos supor que eles aplicam esse produto no período da manhã.
Então, eles ficam com o resíduo no corpo, trabalham
o dia todo, no final da tarde eles estão procurando algum
serviço médico quando não conseguem resultado
com chás caseiros ou algumas indicações familiares.
Então, eles já estão apresentando mal-estar,
dor de cabeça, náuseas. Isso quando a intoxicação
é bem leve. Imagine que qualquer produto químico,
agente tóxico, que sempre tá agredindo o seu organismo,
uma hora, ele dá a resposta. O nível de resposta vai
depender de vários fatores, inclusive da sensibilidade da
própria pessoa.
Na
área de toxicologia ambiental, tem uma distinção
entre poluição e contaminação?
A maioria dos autores científicos não faz distinção
entre esses dois termos. Eles consideram os contaminantes ou poluentes
como substâncias químicas que excedem as concentrações
naturais e causam efeitos adversos aos seres vivos ou aos ecossistemas.
Agora, outros autores dizem que contaminante é a presença
de substâncias em concentrações anormais e o
poluente é a presença de substância que já
causou dano ao ecossistema.
Uma
dos problemas urbanos, atualmente, é a poluição
atmosférica. Quais são os principais poluentes e quais
os efeitos deles na saúde?
Bom, todos os centros urbanos que apresentam poluição
bastante alta tem alguns poluentes que são, primeiro, o monóxido
de carbono (CO), segundo, os óxidos de enxofre, depois os
hidrocarbonetos, o material particulado e os óxidos de nitrogênio.
O monóxido de carbono, dependendo da concentração
no local onde a pessoa está exposta, vai se ligar à
hemoglobina e formar a carboxi-hemoglobina.
Fazendo
um parênteses: a hemoglobina são os glóbulos
vermelhos do sangue?
Exatamente. Eles são o principal responsável pelo
transporte de oxigênio no organismo. Então, o que acontece?
Essa carboxi-hemoglobina impede o transporte de oxigênio.
Dependendo da concentração, você vai apresentar
sintomas, desde uma dor de cabeça até dificuldade
respiratória. A partir de 50% de concentração
de carboxi-hemoglobina, você entra em coma.
Isso
vale tanto para uma região muito poluída de um centro
urbano quanto um ambiente fechado, como uma boate, onde as pessoas
fumam muito…
Tranqüilo! Ou uma cozinha mal ventilada.
A
Organização de Saúde registra um grande número
de intoxicação e morte por monóxido de carbono
em ambientes fechados, inclusive doméstico, considerando
as populações pobres que utilizam lenha como combustível.
Os efeitos de pequenas inalações constantes podem
levar tempo até serem sentidos?
Se for uma quantidade pequena… Como eu disse, se todos
os dias você agride de alguma maneira, vai chegar uma hora
em que teu organismo vai responder.
E
essa resposta pode ser um câncer?
Pode, dependendo da sensibilidade da pessoa. Você pode fazer
desde uma rinite, passando por edema e enfisema, até um câncer
pulmonar.
O
monóxido de carbono é o principal poluente do ar?
O monóxido é o principal poluente. O problema
maior que ele causa são os distúrbios respiratórios.
Claro, ele, junto com outros poluentes primários e secundários,
pode causar um dano bem grave à saúde.
O
que são considerados poluentes primários e secundários?
Quais são as fontes?
Os poluentes primários são aqueles que são
lançados direto na atmosfera. Por exemplo, a indústria
lança poluente diretamente no ar, é identificável.
Os poluentes secundários são aqueles que fazem uma
reação com os componentes da atmosfera e formam um
outro tipo de poluente. A gente classifica as fontes poluentes de
estacionárias e fixas. As estacionárias são,
na maioria, as indústrias, e as móveis, os veículos
automotores. Essas são as grandes fontes de poluentes em
centros urbanos.
E
os outros poluentes: o óxido de enxofre, os hidrocarbonetos,
o óxido de nitrogênio que também são
liberados pela queima de combustíveis?
A maior fonte de compostos de enxofre é antropogênica.
Quer dizer, isso é decorrente da atividade humana. As fontes
naturais são os vulcões e a destruição
de matéria orgânica. Agora, as fontes antropogênicas
são a combustão de carvão e derivados de petróleo
que formam os compostos de enxofre, principalmente nas usinas carboelétricas
e termoelétricas, nas siderúrgicas e metalúrgicas.
A emissão pelo diesel de veículos automotores é
pequena, mas não deixa de ser uma emissão. Os óxidos
de enxofre tem uma ação irritante e podem causar rinite,
laringite, faringite, bronco constrição… problemas
respiratórios mesmo. Os óxidos de nitrogênio
vêm, em maior parte, da combustão também e são
transformados, na atmosfera, em ácido nítrico e nitrato
que vão se depositar na água e na terra. Também
são substâncias irritantes. A longo prazo podem causar
enfisema pulmonar e a curto prazo, edema pulmonar.
Os
óxidos de enxofre e nitrogênio são os principais
componentes da chuva ou água ácida que, entre outros
efeitos, mata peixes e plantas. E na saúde humana, quais
os efeitos?
A literatura não explica esses efeitos nocivos da chuva ácida.
Só tem registro que a chuva ácida provoca irritação
do trato respiratório e das membranas mucosas. Na verdade,
acho que faltam dados e pesquisas prá verificar exatamente
cada detalhe. A pesquisa é fundamental prá ter uma
resposta bem concreta do que acontece.
Aqui,
em Santa Catarina, no sul do Estado, nós temos jazidas de
carvão que são exploradas. Nesse caso existe material
particulado não só na atmosfera, mas principalmente
dentro das próprias minas, onde os trabalhadores estão
respirando isso. O que é esse material particulado e o que
ele causa?
O material particulado é formado por poeira, fumaças,
névoas e neblinas. Ele contribui para o aumento de doenças
respiratórias como bronquite e asma na população
exposta a isso. O mineiro, normalmente, desenvolve uma doença
chamada pneumoconiose. Se você trabalha com grafite é
chamada grafitose, se for sílica, é silicose. Todas
estão relacionadas ao trato respiratório. Isso, a
pneumoconiose, o nosso mineiro tem. Eu não sei, atualmente,
em que grau está esse tipo de enfermidade. Essa é
uma história que a gente sabe de longo tempo que existe,
mas eu não sei em que condições eles trabalham
hoje, se tem equipamento de proteção…
Agora,
o efeito da poluição é maior no inverno…
Por causa da inversão térmica. O solo está
mais frio e forma uma camada de ar frio mais próximo da terra
porque a tendência é que o ar quente suba, esteja em
grandes altitudes. No verão quando o ar está mais
quente, ele leva os poluentes prá grandes altitudes. A inversão
térmica é um fato natural, só que o problema
é que ela causa o acúmulo desses poluentes na parte
mais baixa da atmosfera durante o inverno e as pessoas ficam mais
expostas. A inversão pode durar dias. Por exemplo, em São
Paulo e Cubatão, aumenta o índice de doenças
respiratórias por causa desse fato. Tem um registro de Londres,
no inverno de 1952, quando mais de 4.000 pessoas morreram porque
tinha uma elevação concentração de poluentes
no ar.
Nós
estamos falando de centros urbanos, mas na área rural…
Aí já entra a exposição ocupacional
direta do agricultor porque ele está colocando o agrotóxico
e ficando exposto a esse produto. Tem uma série de produtos,
mas os mais usados são os organofosforados. Antes se usava
os organoclorados. Ainda se usa: o DDT…
Esses
são considerados biocidas porque destróem…
Tudo! Ainda se usa, hoje, no combate à dengue e à
malária.
Se
eles estão proibidos por que ainda se usa?
Eu não saberia dizer o porquê. Eles são proibidos,
mas ainda são usados. São coisas que não se
entende. Na lavoura, o nosso agricultor usa o pesticida organofosforado.
Ele é um agrotóxico que é bem absorvido porque
é bastante lipossolúvel. Então, se é
lipossolúvel, ele é bastante absorvido por via inalatória.
Lipossolúvel
porque é solúvel em gordura? Quer dizer que ele acumula
no tecido adiposo do corpo?
Exatamente. Mais o solvente que você vai misturar… se
for um derivado de hidrocarboneto facilita mais ainda a absorção.
É
um pesticida derivado de petróleo?
Um pesticida com solvente derivado de petróleo. Os dois são
bastante lipossolúveis e tem facilidade de absorção
pelo organismo. Os agrotóxicos são lipossolúveis,
então são bem absorvidos. Por isso, a gente insiste…
eu sei que é uma velha tecla, mas tem que ter equipamento
de proteção.
E
os resíduos desse agrotóxico no alimento que vai prá
mesa do consumidor?
A gente não tem controle porque não tem laboratório
prá ver qual a concentração ou se existem resíduos
dos pesticidas em alimentos. A gente pode ter uma suspeita, quando,
de repente, uma mãe diz que o filho comeu alguma coisa e
passou mal. A gente pode ter a suspeita, agora… controle mesmo,
a gente não tem.
E
agentes tóxicos na água?
É um fato essa poluição da água, mas
o CIT não é muito procurado quanto a isso. Às
vezes, tem pessoas que pedem ajuda e não querem se identificar
porque a casa, em algum lugar do Estado, está próximo
de um lago ou riacho excelente que pode, mais tarde, ser aproveitado
como manancial, mas tem uma pessoa que está jogando resíduos
disso ou daquilo… O que a gente pede é para a pessoa
ligar para um órgão de fiscalização
porque a gente não tem ação de fiscalização,
nós fazemos a parte de informação. Com relação
à intoxicação, nós não fomos
procurados. Pelo menos, o CIT não tem recebido nada. (…)
Eu acho que a Casan tem um controle bom sobre isso, a nossa água
é tratada. A preocupação fica sobre esses mananciais
que estão sendo poluídos e, mais tarde, assim como
se falou há dois ou três anos do apagão, a água
também vai ser um problema bem sério. Eu acredito
que tem que começar uma fiscalização bastante
efetiva porque energia ainda você consegue, entre parênteses,
buscar uma alternativa. E agora para a água, você tem
alternativa? Ela é fundamental. Esse é o problema.
E
com relação à gás?
No gás de cozinha, é colocado um produto para que
você sinta o cheiro se há vazamento. Eu não
me recordo qual, mas há um Estado em que tem bastante notificação
de intoxicação por gás de cozinha. Eles procuram
bastante o centro de informação…
Em
qualquer tipo de intoxicação, quais são as
primeiras medidas que a pessoa tem que tomar?
Depende. Se for um caso de inalação, é preciso
retirar a pessoa do local imediatamente e procurar atendimento médico
porque, às vezes, você pensa que é uma simples
exposição, mas não é, pode ter uma conseqüência
mais grave. Se for intoxicação por contato com um
ácido, uma base, na mão ou em qualquer parte do corpo,
se indica lavar com bastante água. Água pura sem mais
nada. Se for um acidente ocular, também é indicado
lavar com bastante água e procurar o oftalmologista porque
só ele tem condições de dizer qual foi o grau
de lesão. Em qualquer caso, para qualquer informação
que se queira, a gente está disponível vinte e quatro
horas ao dia via telefone ou na emergência do Hospital Universitário.
E
no caso da criança que ingere água sanitária
ou medicamento?
Na ingestão de água sanitária, é contra-indicado
provocar o vômito. Porque, em qualquer situação,
quando a criança tem vômito, ela aspira e isso tem
tendência de ir para o pulmão e provocar uma pneumonia.
Nesse caso, o que mãe deve fazer é manter a criança
calma e procurar atendimento médico. O máximo que
a mãe pode fazer é lavar bem a boquinha da criança
com água. Não se deve fazer a criança beber
leite, outras coisas… porque se ela estiver um pouquinho nauseada
e provocar vômito, isso vai complicar. Tem atitudes que podem
complicar um quadro leve de intoxicação e levar a
um quadro moderado ou até grave. A gente tem muitos ditos
populares. "Qualquer coisa, dá leite, provoca vômito".
Não é assim. Lavar o local da picada de animal peçonhento
é o mais indicado. Há casos em que a pessoa passa
álcool, passa cachaça… Não, passa água
e procura atendimento. O soro é específico para cada
caso. A picada de serpente, por exemplo, tem um tipo de sintoma
bem específico e um soro específico que existe em
todos os hospitais do Estado.
A
maior parte das picadas acontecem do joelho para baixo…
É, porque as pessoas estão sem botas… A menos
que você esteja dentro de mata fechada e a serpente esteja
enrolada num galho, ela pode pegar uma região do tronco superior.
Mas caso contrário, não. É só observar
bem. Ficar atento.
Normalmente,
as serpentes não são agressivas?
As jararacas são agressivas, atacam porque sentem a presença
pela temperatura do corpo porque elas não enxergam, não
ouvem… Ela sente a presença e vai picar prá se
defender. A coral é uma cobra mais dócil, ela só
vai picar mesmo se você pisar nela ou se ela sentir que vai
ser agredida.
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